O pintor do Atlântico

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O pintor tomou posição, esticou a coluna vertebral, seus olhos no ponto de fuga. Era a décima terceira tentativa, a décima terceira tela, a décima terceira manhã e, pela décima terceira vez, ele pensava: “Só mais uma chance.”

Os olhos fitaram nuances, cores e tons a serem preparados no godê e curiosos entreolhavam-se: “Ele não desiste?”. O mar estava agitado. O esboço lhe pareceu mais refinado daquela vez: pedras e palmeiras novas foram rascunhadas; luzes e sombras posicionadas; movimentos, dobras e curvas esquadrinhavam a tela ainda branca.

Os pincéis preencheram primeiro o fundo azul turquesa. Manchas brancas acinzentadas contrastavam com o céu. Os que ali passavam zombavam de sua insistência vã. O suor deslizava em sua face e o sal queimava seus lábios. “Há tanta coisa melhor para se fazer em uma praia!” – balançavam a cabeça.

Um vento impetuoso agitou o cavalete e a tela foi ao chão. A areia salpicou tanto as tintas quanto seus olhos que arderam feito fogo. Algumas pessoas pareciam comemorar a nova derrota. O pintor limpou os olhos com água de beber e alcançou a tela que já havia deslizado por sobre a areia. “Agora é lixo.” – pensou ele. Olhou ao redor e muitos desviaram a atenção para o mar, o céu, a vida. “Droga!” – gritou ele, jogando a tela em um tambor enferrujado. O pintor dobrou o cavalete, limpou o esfoliado godê, as bisnagas, os pincéis e acomodou tudo o que podia em sua bolsa transversal. “Droga!” – repetiu enquanto passava novamente diante do tambor. Os curiosos sorriram vitoriosos: “O pintor do Atlântico falhou outra vez.”

O dia passou. Outra manhã chegou.

O pintor tomou posição, esticou a coluna vertebral, seus olhos no ponto de fuga. Era a décima quarta tentativa, a décima quarta tela, a décima quarta manhã e, pela décima quarta vez, ele pensava: “Só mais uma chance.”

(Leo Pessoa)

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